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Projeto Museu na Escola: Sabia que vocĂȘ tem um museu?

Atualizado: 29 de abr. de 2024

BĂĄrbara Dantas


*Se precisar citar, tĂȘ-lo como referĂȘncia, seguir:

DANTAS, BĂĄrbara. Projeto Museu na Escola: sabia que vocĂȘ tem um museu? Museu de Arte do EspĂ­rito Santo-MAES. VitĂłria. 2012. DisponĂ­vel em: https://www.barbaradantas.com/post/projeto-museu-na-escola-sabia-que-voc%C3%AA-tem-um-museu


Resumo:

A sociedade brasileira Ă© pouco afeita ao costume de ir a museus. Os cidadĂŁos que vivem nas regiĂ”es perifĂ©ricas das grandes metrĂłpoles sequer sabem da existĂȘncia de algumas destas instituiçÔes que abrigam, promovem e disseminam a arte e a histĂłria. No entanto, VitĂłria, a capital de nosso estado, tem alguns museus que estĂŁo de portas abertas para a população sem custos de entrada. Dessa forma, decidimos criar um projeto que levasse o museu atĂ© esse pĂșblico. Assim, surgiu o Projeto Museu na Escola. Este trabalho mostrarĂĄ nossas atividades e propostas entre os anos de 2009 e 2011 dentro do Projeto. Compartilharemos, principalmente, o espaço ofertado ao pĂșblico como meio condutor de uma realidade na qual a valorização do patrimĂŽnio, da cultura e da histĂłria sejam impulsionadores de um salto para uma nova realidade social. NĂŁo fomos Ă s escolas somente para falar aos alunos, fomos conversar com eles.


Palavras-chave:

PatrimĂŽnio. Museu. Arte. HistĂłria.

Resumen: la sociedad brasileña no es acostumbrada a visitar museos. Los ciudadanos que viven en las zonas perifĂ©ricas de las grandes ciudades siquiera saben de la existencia de algunas de estas instituciones que abrigan, promueven y difunden el arte y la historia. Sin embargo, Victoria, la capital de nuestro Estado, tiene algunos museos que se encuentran com sus puertas abiertas para las personas sin ninguno costo para el ingresso. Por lo tanto, hemos decidido crear un proyecto para llevar el museo al pĂșblico. De ese modo, surgiĂł el Proyecto Museo en la Escuela. Este trabajo muestra nuestras actividades y propuestas entre los años 2009 y 2011 dentro del Proyecto. Compartiremos, especialmente el espacio del museo ofertado al pĂșblico como un medio conductor para una realidad en la cual la apreciaciĂłn del patrimonio, la cultura y la historia son los impulsadores de un salto a una nueva realidad social. No fuimos a las escuelas sĂłlo para hablar a los estudiantes, fuimos hablar con ellos.


Palabras clave: Herencia. Museo. Art. Historia.


Abstract: Brazilian society is not very fond of going to museums. Citizens who live in the peripheral regions of the great metropolises do not even know of the existence of some of these institutions that shelter, promote and disseminate art and history. However, VitĂłria, the capital of our state, has some museums that are open to the public with no entrance costs. In this way, we decided to create a project that would take the museum to this public. So, the Museum Project at School started. This work will show our activities and proposals between the years of 2009 and 2011 within the Project. We will mainly share the space offered to the public as a means of conducting a reality in which the valuation of heritage, culture and history are the drivers of a leap to a new social reality. We did not go to the schools just talk to the students, we went to talk with them.


Keywords: Patrimony. Museum. Art. History.


1. Nossas propostas


“Processo educativo, cultural e cientĂ­fico, articulado de forma indissociĂĄvel ao ensino e Ă  pesquisa e que viabiliza uma relação transformadora entre a universidade e a sociedade”[3] O Projeto Museu na Escola tentou (nos dois anos de sua existĂȘncia, 2009-2011) valorizar e articular cada um destes aspectos: a ciĂȘncia, a cultura e a educação.



Figura 1: Emblema e folder do projeto.


A partir da ciĂȘncia: por meio da parceria entre a Universidade Federal do EspĂ­rito Santo - UFES (professores/orientadores) e o Museu de Arte do EspĂ­rito Santo - MAES (Setor de Arte Educação), formulamos uma pesquisa que tem como base metodolĂłgica e teĂłrica os conceitos ligados Ă  Museologia, HistĂłria e Educação Patrimonial. Submetemos nossa proposta Ă s avaliaçÔes dos professores/orientadores, Ă  equipe do museu, em evento acadĂȘmico (ANPOF, Ouro Preto, 2011), ao pĂșblico do MAES e da UFES antes de chegarmos ao nosso principal pĂșblico alvo: as escolas. Tudo isso, para termos uma sĂłlida base teĂłrica, metodolĂłgica e discursiva enriquecedora para o pĂșblico escolar.


Encontro com a cultura: A CiĂȘncia Ă© um excelente suporte, mas nĂŁo responde a muitos questionamentos mais individuais e emocionais. Antes de tudo, precisĂĄvamos “tocar” o sentimento do pĂșblico. Para isso, olhamos para nĂłs mesmos, para nossa carga cultural, para nosso entorno. DevĂ­amos deixar aflorar nossa alteridade: olhar para o prĂłximo sem prĂ©-conceitos ou preconceitos. Porque este Projeto seria falho se chegĂĄssemos Ă s escolas como meros transmissores de conhecimentos e passĂĄssemos nosso recado a ouvintes silenciosos; retornando para nossas casas com um (errado) sentimento do dever cumprido.


Na Educação Patrimonial encontramos o suporte necessĂĄrio para um discurso no qual as experiĂȘncias do pĂșblico tĂȘm espaço ao transformar nossa atuação nĂŁo em uma palestra, mas em uma conversa. Uma atividade onde o pĂșblico pudesse interagir conosco expondo suas experiĂȘncias junto ao meio social em que vivem, com o prĂłximo, com o diferente, com a natureza e com o afeto.


Educação Informal: conteĂșdo pronto, discurso afinado e equipamento em mĂŁos, chegamos Ă s escolas. Ao termo de cada atividade, descobrimos que nosso conteĂșdo foi influenciado pela troca de experiĂȘncias durante as nossa estada nas escolas. Cada turma foi uma surpresa. Adaptamos nosso discurso ao perfil delas, presenciamos falas importantes de alunos considerados indisciplinados e de outros que nunca se expressavam. Ficamos emocionados com relatos de memĂłrias dolorosas na Oficina de MemĂłria, bem como de desenhos e textos magnĂ­ficos.


Dessa forma, afirmamos com propriedade que o pĂșblico escolar tem muito o que dizer. Basta ter alguĂ©m para ouvi-los. Este mesmo pĂșblico tem muita vontade de aprender, sĂł precisa de alguĂ©m para ajudĂĄ-los. A interação do pĂșblico escolar conosco foi o principal legado do Projeto.


2. Um retrato da realidade


Os museus da contemporaneidade tĂȘm um novo perfil. É uma instituição que agrega o mĂĄximo de vivĂȘncias e parcerias educacionais em prol do seu pĂșblico. Procura, dessa forma, sanar as deficiĂȘncias de incentivo Ă  cultura presentes em grande parte do nosso paĂ­s. Este novo papel dos museus convive com uma realidade cultural que convive com uma estrutura social ineficaz e deficitĂĄria. Os nĂșmeros sĂŁo desalentadores, para os 5.560 municĂ­pios brasileiros:


- 78% deles tĂȘm pelo menos uma biblioteca;

- 44% tĂȘm uma banda de mĂșsica;

- 17% tĂȘm um museu;

- 19% tĂȘm um teatro ou casa de espetĂĄculo;

- 7,5% tĂȘm uma sala de cinema e apenas 6% tĂȘm uma orquestra;

- Somente 13% possuem um Conselho Municipal de Cultura, sendo que desses, apenas metade tem periodicidade frequente ou muito frequente (IBGE, 2005).


3. Nossas atividades e pĂșblico alvo


A temĂĄtica escolhida para compor o projeto para o MAES em 2009 foi “A histĂłria dos museus e educação patrimonial”. Renan Andrade e BĂĄrbara Dantas - entĂŁo, monitores de pĂșblico - sentiram uma carĂȘncia de informaçÔes prĂ©vias tanto do corpo discente quanto do docente nos grupos de escolas que visitavam regularmente o museu. Notou-se, especialmente, a falta de capacitação por parte dos professores com relação a conceitos importantes ligados aos museus, suas prĂĄticas e sua histĂłria. No entanto, identificamos tambĂ©m uma sede de conhecimento por parte dos alunos, sĂł lhes faltavam oportunidades.


As palestras realizadas no projeto aludem, principalmente, para o papel do museu na sociedade em formação - os estudantes de ensino fundamental e médio. Tentamos transmitir o conhecimento necessårio para a criação de um cidadão convicto do seu papel perante os bens culturais existentes ao seu redor. Isto auxilia o processo de inclusão sociocultural dos mesmos (GANZER, 2005).


Idealizamos o Projeto Museu na Escola como uma ferramenta de aproximação entre as instituiçÔes museu e escola. Formar e informar o ensino das artes e da histĂłria. Valorizar a ideia do espaço do museu como um bem cultural e educacional pĂșblico, ou seja, aberto a todos. Tentamos, tambĂ©m, trazer para os limites da individualidade os conceitos mais gerais de patrimĂŽnio e de identidade cultural.


Procuramos uma abordagem lĂșdica e rica visualmente. Os tipos de museus existentes fizeram parte de nosso conteĂșdo por meio de alguns exemplos mais conhecidos da realidade nacional e, principalmente, estadual, como: o Museu Regional, o Museu Casa, entre outros. AtĂ© chegarmos ao Museu de Arte do EspĂ­rito Santo - DionĂ­sio Del Santo.


Figura 2: Slide da palestra. Imagem de DionĂ­sio Del Santo, artista capixaba que dĂĄ nome ao museu. Ao lado, marca do MAES.


O ponto forte de nossa atuação nas escolas foi a Oficina de MemĂłria, atividade proposta por nossa orientadora, a profa. Gilca Flores do NCR, NĂșcleo de Conservação e Restauração da UFES. Para ela, nĂŁo cabe a nĂłs chegarmos nas escolas com um discurso pronto e decorado, precisamos, acima de tudo, dar voz ao pĂșblico escolar. Assim, apĂłs a palestra, conversamos com os alunos a respeito de suas realidades na tentativa de incluir no diĂĄlogo alguns conceitos e realidades que abordamos na palestra.


A partir dessa conversa, sugerimos aos presentes desenhar ou escrever algo importante em uma folha cedida por nĂłs. Nela, o aluno registra o que gostaria de guardar em uma "caixa do tempo" que serĂĄ aberta somente em um futuro distante. Um registro do que mais gostava de ter ou fazer, de sentimentos conflitantes, da leitura que o aluno faz do mundo ao seu redor.


E tivemos muitas surpresas...


Abaixo, inserimos alguns dos mais exemplares testemunhos registrados em nossas Oficinas de MemĂłria:


Figura 3: Pedra dos dois olhos, um dos marcos geogråficos da região, considerada um patrimÎnio da comunidade. Abaixo, um pedido para se preservar a Gruta da Onça.

Figura 4: Medalhas. O esporte como um bem a ser preservado.


Figura 5: “abrigar, conservar, expor: museu” como registrado acima. Sua boneca Ă© um bem precioso. Abaixo, a Terceira Ponte, ligação entre as cidades de VitĂłria e Vila Velha.


Figura 6: Em cima, a aluna considera o MAES, o santuĂĄrio Convento da Penha, a pintura Monalisa, a montanha O Frade e a Freira e o PalĂĄcio Anchieta como patrimĂŽnios importantes.

Abaixo, a aluna do 9o ano considera seu bem mais valioso a lembrança da primeira vez que viu o pai adotivo. O computador Ă© motivo de uma reverĂȘncia profunda em outro registro estudantil, uma crĂ­tica voraz.


Figura 7: Não é somente a panela de barro que é patrimÎnio, mas a sua receita, a matéria prima, o seu modo de ser feito e a comunidade que vive em torno de sua produção.


Ao cabo de nossas atividades nas escolas, chegamos aos seguintes dados quantitativos: atendemos 07 escolas da rede estadual pĂșblica de ensino fundamental e mĂ©dio. Cerca de 1.270 pessoas fizeram parte de nossos trabalhos, incluindo a palestra e a Oficina de MemĂłria.


4. Um pouco de nosso conteĂșdo


A seguir, mostraremos um pouco do que abordamos em nossas palestras nas escolas: o significado etimolĂłgico da palavra museu, sua histĂłria e seus tipos (ICOM, 2009). Por fim, a exposição de alguns conceitos importantes a respeito de educação patrimonial. Afinal, o MAES Ă© um espaço pĂșblico e pertence a cada um dos que participaram do projeto. Espaço pĂșblico e Ă  espera da visita de seus mantenedores.


As musas do museu


Figura 11: Slide da palestra. As musas da mitologia grega.


As musas, na mitologia grega, eram filhas de Zeus e Mnemosine, a divindade da memĂłria. Eram deusas que personificavam e presidiam o pensamento em todas as suas formas. Cada musa tinha a capacidade de inspirar a criação artĂ­stica ou cientĂ­fica (DETIENNE, 1988). No Egito de Ptolomeu I, no sĂ©culo IV a. C., o mouseion de Alexandria abrigava esculturas, instrumentos cirĂșrgicos e astronĂŽmicos, pedras e minĂ©rios de terras distantes.[4]


PatrimĂŽnio da humanidade


Figura 12: slide da palestra. Museus no Brasil.


Somente a preservação da cultura viva guarda de forma integral as suas manifestaçÔes: materiais e imateriais. Os objetos museais sĂŁo fragmentos de uma cultura e ajudam a contar a histĂłria de uma comunidade, de um paĂ­s, de uma etnia. A ampliação da ideia de museu e de patrimĂŽnio acarretou grandes modificaçÔes nas exposiçÔes de diversos museus. Mais do que coletar, estudar e manter coleçÔes de objetos artĂ­sticos, histĂłricos ou cientĂ­ficos, os museus se voltaram para a preservação das referĂȘncias patrimoniais das diversas sociedades.


A curiosidade nos gabinetes


Figura 13: slide da palestra. Gabinetes de curiosidades. Colecionar e expor.


Os homens ricos sempre tiveram tempo e dinheiro para viajar. Ainda no séc. XVI, destas viagens, trouxeram aos seus palåcios ou castelos todo tipo de objeto de importùncia histórica ou artística do local que visitavam. Salas foram especialmente construídas para abrigar a infinidade destes objetos, tais como: fragmentos arqueológicos, empalhados, pinturas, esculturas, entre outros. Estas salas são conhecidas como gabinetes de curiosidades devido à variedade de objetos expostos em um mesmo ambiente (SCHNEIDER, 2009, p. 157).


O museu de Oxford


Figura 14: slide da palestra. Ashmolean Museum. Museu aberto ao pĂșblico.


Elias Ashmole (1617-1692) foi um ĂĄvido colecionador. Quase no fim de sua vida, doou a maioria dos objetos raros e exĂłticos que adquiriu para a Universidade de Oxford. TambĂ©m doou a sua coleção de livros e manuscritos. O Ashmolean Museum, museu da Universidade de Oxford, tornou-se o primeiro museu do mundo aberto ao pĂșblico ainda no sĂ©c. XVII.


A histĂłria nas igrejas


Figura 14: slide da palestra. Idade Média: preservação da cultura clåssica greco-romana.


Na Idade Média - ao contrårio do que se pensa - muitos nobres, intelectuais e clérigos admiravam e apoiavam a cópia, compilação e realização de obras filosóficas, históricas e artísticas. Os castelos, mosteiros e igrejas medievais abrigavam grandes coleçÔes de obras valiosíssimas para a História e para a Arte.


O museu revolucionĂĄrio


Figura 16: slide da palestra. O Louvre abre suas portas.


ApĂłs a Revolução Francesa de 1789, a população bradava os ideais de Igualdade, Fraternidade e Liberdade. Nada mais democrĂĄtico, portanto, do que dispor ao pĂșblico a visita a um local no qual pudessem admirar obras de arte. AtĂ© entĂŁo, este privilĂ©gio era dado somente aos nobres e Ă  realeza. Assim o Louvre foi inaugurado em 1750, mas somente em 1793 foi aberto ao pĂșblico.


Tipos de museu


Figura 17: slide da palestra. Tipos de museus.


- Museu clĂĄssico: Museu Imperial, PetrĂłpolis- RJ.

- Museu de territĂłrio: Museu de Biologia/professor Melo LeitĂŁo, Santa Tereza-ES.

- Museu regional: o Museu do Colono, Santa Leopoldina-ES.

- Museu casa: Museu Casa de Santos Dumont, PetrĂłpolis-RJ.

- Museu de Arte: MAES, VitĂłria-ES.


Dentre os tipos de museu temos os que abrigam obras de arte como o Museu de arte do Espírito Santo. De acordo com seu regimento interno, a instituição:


Pretende ser um espaço de apresentação e discussĂŁo das artes visuais, contemplando tanto a produção da tradição artĂ­stica como a arte contemporĂąnea, atravĂ©s de exposiçÔes, mostras, cursos, seminĂĄrios, palestras e outras atividades pertinentes Ă  ĂĄrea; Garantir acesso Ă s artes visuais ao pĂșblico em geral, explorando as potencialidades museolĂłgicas nos processos de inclusĂŁo sociocultural; Desenvolver e colaborar com o desenvolvimento de projetos que promovam o envolvimento e a participação da comunidade em geral e do pĂșblico visitante (SECULT, 2008).


PatrimĂŽnio


Figura 18: slide da palestra. De onde vem o patrimĂŽnio?


A fim de enfatizar as relaçÔes patrimoniais com a difusĂŁo dos bens culturais, um dos cenĂĄrios propostos e institucionalizados Ă© o museu.[5] Nele, evidencia-se o material produzido pelo homem e por seu meio. No museu pode-se, tambĂ©m, compreender suas açÔes e projeçÔes de pensamento aliado ao termo cultura: o ser humano, por ser racional, Ă© um ser cultural. Logo, sua forma de agir e pensar gera cultura, modos de produção, manifestaçÔes culturais, tais como a moda, mĂșsica e arte. Todas elas dĂŁo sentido Ă  existĂȘncia do homem.


A origem etimológica da palavra cultura remonta ao final do século XVIII no termo germùnico kultur, simboliza os aspectos espirituais de uma comunidade. Jå a palavra francesa civilization referia-se, principalmente, às realizaçÔes materiais de um povo, até que, por fim, esse termo foi sintetizado (BELTRÃO, 2002).


Edward Tylor (1832-1917), um dos primeiros pensadores da antropologia, designou à palavra inglesa culture, em seu sentido etnográfico, todos os “conhecimentos, crenças, arte, moral, leis, costumes adquiridos pelo homem inserido na sociedade” (LARAIA, 2001).


Apesar dessa classificação geral, é importante frisar que o termo cultura variou em função de épocas e sociedades diferentes. Ainda no conceito antropológico, cultura é um comportamento aprendido e que independe da transmissão genética. Considerando que a mente humana é uma caixa vazia por ocasião de nascimento, o homem produz, a partir daí, uma forma específica para se adaptar ao meio ambiente.


Essa atitude envolve a produção de conhecimento e técnicas que são apreendidas e transformadas por cada geração. Pode-se comparar a isso o avanço tecnológico, que na maioria das vezes, é um desdobramento do conhecimento produzido por técnicas anteriores e pelo processo histórico. Portanto, a cultura do homem abarcarå tudo que caracteriza uma população humana. Compreende o testemunho do homem e seu meio, då significado aos bens culturais (IEPHA-MG, 2009).


Numa escala de comunidade até a de humanidade, a soma dos bens culturais de um povo abarca o sentido de patrimÎnio, contém valores que serão legados a geraçÔes futuras. Esses bens culturais podem ser divididos em naturais e culturais que, por sua vez, se divide em materiais e imateriais.


Os bens naturais independem da ação do homem e agregam o meio ambiente, composto pelos rios, matas, grutas, etc. Enquanto que os bens culturais imateriais compreendem as tradiçÔes e tĂ©cnicas “do fazer” e do “saber fazer” humanos e as manifestaçÔes individuais e coletivas, tais como o folclore, a religiĂŁo, a mĂșsica, a dança.


Por fim, os bens culturais materiais, se dividem em mĂłveis e imĂłveis. MĂłveis englobam a produção pictĂłrica, escultĂłrica, o mobiliĂĄrio, objetos de utensĂ­lio, entre outros. ImĂłveis definem os edifĂ­cios e seu entorno, que garante visibilidade e referĂȘncia de um povo e lugar.


ImprescindĂ­vel destaque Ă© o fato de que nem todo conteĂșdo da cultura que estĂĄ envolvido na noção de cultura material. A cultura se exprime na matĂ©ria, mas pode ser definida como a relação do homem com a matĂ©ria.


Cultura preservada se torna patrimÎnio. Historicamente, a palavra estå ligada à noção de herança, de memória do indivíduo, dos bens de uma família. Mas a ideia de patrimÎnio comum a um grupo social, definidor de sua identidade e merecedor de proteção nasce no final do século XVIII (BABELON; CHASTEL, 1980). Para além dos ideais iluministas, motivou-se impedir o vandalismo causado por alguns períodos mais conturbados da revolução Francesa (GRAMMONT, 2006).


A ideia de nação dessa Ă©poca garantiu o estatuto ideolĂłgico do conceito de patrimĂŽnio, no qual o Estado deve assegurar a preservação de seus bens culturais, pois definem-no. A partir daquele contexto, estabeleceram-se prĂĄticas que ampliaram o circuito dos colecionadores e apreciadores de antiguidades e, tambĂ©m, criou-se exposiçÔes, edição de catĂĄlogos, venda pĂșblica de obras, entre outras iniciativas (FONSECA, 1997).


Atualmente, a definição de patrimĂŽnio cultural se dĂĄ por toda produção humana - de ordem emocional, intelectual, material e imaterial - que proporcione o conhecimento e a consciĂȘncia do homem sobre si mesmo e sobre o mundo que o rodeia (IPHAN, 2006). TambĂ©m Ă© plausĂ­vel definir o termo tombamento como:


O conjunto de açÔes realizadas pelo poder pĂșblico com o objetivo de preservar, atravĂ©s da aplicação de legislação especĂ­fica, bens mĂłveis ou imĂłveis de valor histĂłrico, cultural, arquitetĂŽnico, ambiental e tambĂ©m de valor afetivo para a população, impedindo que venham a ser destruĂ­dos ou descaracterizados, contribuindo, dessa forma, para o reforço da identidade local (IPHAN, 2006).


Ao cabo, discutimos o valor cultural de um bem e a importùncia de sua preservação. O foco reside em sua capacidade de estimular a memória das pessoas historicamente vinculadas à sua comunidade e sua contribuição na garantia da preservação da sua identidade cultural na busca por uma melhor qualidade de vida. A preservação do patrimÎnio implica no bem estar material e espiritual do indivíduo e possibilita o exercício da cidadania.


A preservação garante a continuidade das manifestaçÔes culturais.


5. ConclusĂŁo


Esta equipe interdisciplinar - uniĂŁo da arte com a histĂłria, alĂ©m de conceitos das ĂĄreas de PatrimĂŽnio e Museologia - atuou de forma lĂșdica e com um discurso que obtivesse do pĂșblico uma situação de pertencimento e afinidade com as questĂ”es levantadas na palestra e na Oficina de MemĂłria. Formação de uma visĂŁo da realidade circundante alĂ©m dos limites sociais impostos, por vezes, por uma situação nada acalentadora. Ver nas escolas, instituiçÔes irradiadoras de conhecimento Ă s crianças e jovens, uma forma de favorecer a inclusĂŁo sociocultural das mesmas.


Por meio de pesquisa qualitativa do Setor de Arte Educação do MAES com alunos e professores que visitam o museu junto a grupos de escolas, constatou-se a falta de informação prévia sobre a instituição e sobre a exposição visitada, o que dificulta a interação com as obras de arte e o entendimento da proposta dos artistas. Com isso, nossas atividades visaram dar, inicialmente, um breve panorama da história dos museus no Ocidente e mostrar os tipos de museus existentes.


A parceira do MAES (Museu de Arte do EspĂ­rito Santo) com a UFES (Universidade Federal do EspĂ­rito Santo) elaborou um projeto direcionado aos estudantes do ensino fundamental e mĂ©dio das escolas. Tentamos mostrar como o museu pode ser um ambiente rico nĂŁo sĂł de cultura, mas de histĂłria e – por que nĂŁo?! – de diversĂŁo.


Ao termo do ano 2011, data final de nosso projeto, os sentimentos foram contraditĂłrios: ao mesmo tempo, a sensação de dever cumprido, mas, sobretudo, um vazio. A avaliação final nos mostrou que a demanda por cultura nas crianças e jovens vĂŁo alĂ©m do que as propostas de nosso projeto puderam suprir. As necessidades sociais e econĂŽmicas dos estudantes e professores sĂŁo tĂŁo alarmantes que falar a respeito de cultura e conseguir tocar seus coraçÔes Ă© uma tarefa hercĂșlea, mas possĂ­vel. Basta o incentivo certo. E desviaremos nossos olhares da realidade para um outro lugar: aquele das musas, o mouseion, local onde a mente e o coração pode vaguear por lugares outros, mais serenos e contemplativos.


5. ReferĂȘncias


BABELON, Jean-Pierre; CHASTEL, AndrĂ©. La notion de patrimoine. Paris: Liana Levi, 1994. (1ÂȘ Ed. Revue de l’Art 49, 1980).

BELTRÃO, Ana Raquel. “Patrimînio Cultural: novas fronteiras”. Prim@ Facie - ano1, n. 1, jul/dez 2002.

CADERNO de diretrizes museolĂłgicas. I. BrasĂ­lia: MinistĂ©rio da Cultura/ Instituto do PatrimĂŽnio HistĂłrico e ArtĂ­stico Nacional/ Departamento de Museus e Centros Culturais, Belo Horizonte: Secretaria de Estado da Cultura/ SuperintendĂȘncia de Museus, 2006. 2Âș Edição.

COMO GERIR UM MUSEU. Curso Ă  distĂąncia. Belo Horizonte: ICOM, 2009.

DETIENNE, Marcel. Os mestres da verdade arcaica. Rio de Janeiro: Zahar, 1988.

FONSECA, Maria Cecília Londres. O patrimÎnio em processo: trajetória da política federal de preservação no Brasil. Rio de Janeiro, UFRJ/ Iphan, 1997.

GANZER, Adriana Aparecida. Museu, Educação e Cultura: Turbilhão de sentimentos e imaginaçÔes: as crianças vão ao museu, ou ao castelo. Campinas: Papirus, 2005.

GRAMMONT, Ana Maria de. “Opiniones y ensayos, la construciĂłn del concepto de Patrimonio Historico: restauraciĂłn y cartas patrimoniais.” PASOS: revista de Turismo y Patrimonio Cultural, vol. 4, n. 003, Universidad de La Laguna, La Laguna, España, 2006. p. 437 – 442.

IEPHA-MG. “Sobre cultura e patrimînio cultural”. Disponível em: http://www.iepha.mg.gov.br/sobre-cultura-e-patrimonio-cultural. Acesso em 20/11/2009.

LARAIA, Roque de Barros. Cultura: um conceito antropolĂłgico. Rio de Janeiro, Jorge Zahar, 2001.

LEMOS, Deise Maria Oslegher. Regimento Interno do Museu de Arte do EspĂ­rito Santo. Secretaria de Estado da Cultura. VitĂłria: SECULT, 2008.

SCHNEIDER, Norbert. Naturezas-mortas. ColĂŽnia: Taschen, 2009.

SUANO, Marlene. O que Ă© museu. SĂŁo Paulo: Brasiliense, 1986.


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Notas:

[3] Ver em: http://www.proex.ufes.br/

[4] “O mouseion era, entĂŁo, esse local privilegiado, onde a mente repousava e onde o pensamento profundo e criativo, liberto dos problemas e afliçÔes cotidianas, poderia se dedicar Ă s artes e Ă s ciĂȘncias” (SUANO. 1986).

[5] Na definição do Conselho Internacional de Museus (ICOM), tem-se esse espaço como “estabelecimento permanente, sem fins lucrativos, a serviço da sociedade e de seu desenvolvimento, aberto ao pĂșblico, que coleciona, conserva, pesquisa, comunica e exibe, para o estudo, a educação e o entretenimento, a evidĂȘncia material do homem e seu meio ambiente”.


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